Guia de sanidade mental para tempos de crise

E eis que tudo mudou.

Não se fala em outra coisa nos jornais, nas redes sociais, nos grupos de Whatsapp. Ou estamos isolados em casa, ou correndo risco de contaminação. Estamos em meio a maior crise da nossa geração, no epicentro de uma situação que não se sabe até quando vai durar.

Existem muitos desafios postos nesse cenário. Um deles, que interfere diretamente em todos os outros, é como cuidaremos da nossa saúde mental.

As coisas já não estavam fáceis antes, e agora parece que piorou. Se antes de tudo isso, já estávamos estressados, ansiosos e deprimidos, como seguir adiante?

Esse artigo visa te explicar um pouco do que está acontecendo aí dentro da sua cabeça enquanto o mundo entra em parafuso, e te oferecer algumas ferramentas acessíveis, para que eu e você consigamos atravessar esse momento da melhor forma possível.

Se tiver tempo e paciência, te recomendo ler o artigo inteiro. Se essa introdução já foi demais pra você, pule direto pras dicas, e volte quando puder (se quiser).

Você precisa se permitir sentir, para conseguir superar

Empurrar os problemas pra debaixo do tapete nunca resolveu nada.

O mesmo acontece com as nossas emoções e com o nosso stress. E isso não é frase de efeito, é ciência: a nossa resposta mental e física às emoções acontece de forma cíclica e em uma só direção, que é em frente.

Quando somos tomados por uma ansiedade, por um medo, ou raiva, segurar esse medo dentro de nós não faz com que ele desapareça: faz com que ele fique represado dentro de nós, ditando as nossas ações muito mais do que imaginamos.

A pesquisadora e recente fenômeno de Netflix, Brené Brown, fala sobre a relação direta entre nos permitirmos sentir as emoções (“boas” ou “ruins”) e sermos mais felizes.

A primeira dica que eu quero te dar pra esse momento, portanto é: sinta.

Sinta o medo. Sinta a raiva. Sinta a tristeza.

Está tudo bem não se sentir bem. Não compare o que você sente ou os seus problemas, com os do vizinho.

Todos nós estamos com medo, dos mais aos menos privilegiados. E todos nós precisamos nos confrontar com esse medo, individualmente.

Não tenha medo de ter medo.

Sinta, fale, escreva, pinte, grite as suas emoções. É só assim que você vai permitir que ela passe por você e vá embora.

Com o stress é parecido. Nesse caso, contudo, você precisa reforçar pro seu cérebro que, apesar de não parecer, você está seguro. Em situações como a que vivemos hoje, nossos sistemas de defesa facilmente entram em alerta. O que é ótimo quando corremos real risco de vida, mas péssimo se vivido dia após dia.

E aqui vem a minha segunda dica: lembre a sua mente e o seu corpo que você está seguro. Exercícios de respiração e meditação atuam muito bem nisso. Conversar com amigos, fazer terapia, cantar, dançar e exercitar o corpo também ajudam.

Lidando com a incerteza

Um dos maiores incômodos da nossa situação atual é a impotência: a gente não sabe até quando vai precisar ficar em casa, não sabe o que será dos nossos empregos, não sabe se as pessoas que a gente ama passarão imunes a essa.

É realmente assustador. De novo, se permita sentir essa incerteza, e entenda que uma parte sua está só querendo te proteger. As nossas ansiedades nunca são totalmente infundadas, e isso é importante lembrar. Perceba que essa parte sua só quer o seu bem mas não sabe muito como fazer isso (como uma mãe superprotetora).

O Simon Sinek, que ficou mundialmente conhecido em sua palestra sobre propósito, tem outra fala muito interessante sobre jogos finitos e infinitos. O livro mais recente dele é sobre isso, inclusive.

A ideia é complexa e poderia render um artigo só sobre isso, mas deixa eu te trazer o conceito básico: existem dois tipos de jogos, os finitos (imagine uma partida de futebol, com regras, começo, meio, fim, vencedores e perdedores); e os infinitos (imagine um jogo de RPG, que dura dias, semanas, e cujo maior objetivo é simplesmente seguir jogando).

Todas as situações na nossa vida podem ser enquadradas em um desses dois tipos. O sofrimento, muitas vezes, decorre de esperarmos um apito final de situações que não tem esse apito.

Pense na carreira: ela é um jogo infinito, mas aprendemos a encará-la como finito. Aprendemos que precisamos aspirar a tal cargo, tal salário, tal prêmio. E depois disso? O que importa, mesmo, é se manter jogando. Não existem vencedores.

Uma crise como essa que estamos passando hoje é um jogo infinito. E é por isso que nos irrita tanto ver gente nos dizendo pra “tirar o melhor da quarentena”. Não existem vencedores numa pandemia. Existe continuar jogando. O que importa é continuar acordando, dia após dia.

O que mais importa nos jogo infinitos são os nossos valores e o nosso propósito. Se a gente tem clareza de estar indo atrás do que realmente importa, e se a gente se conhece o suficiente pra entender que os nossos dias tem algum sentido (seja ele realizado no trabalho, de forma voluntária, ou em família), a gente segue adiante, dia após dia.

Alguns dias serão terríveis.
Alguns dias serão maravilhosos.

E não importa. O amanhã vai continuar chegando.

Assista a palestra do Simon sobre esse tema.

A minha terceira dica é: não se iluda mirando uma linha de chegada. Busque o que faz sentido pra você, e foque em viver bem cada dia. E f#d@-se o resto.

Uma lista de ações que podem te ajudar, feita por especialistas

Aqui eu serei mais prática. Muita gente tem dado conselhos de produtividade e saúde para esse período. Eu gosto de dar ouvidos a quem realmente entende do assunto.

E aí eu te trago as orientações do Dr. Bepi Raviola, Diretor de Saúde Mental da Partners in Health (ONG especializada e calejada em atravessar crises de saúde pública).
Segue as dicas do Dr. Raviola:

  • 1 – Distanciamento social não é distanciamento emocional: use e abuse da tecnologia para se conectar com outros.
  • 2 – Mantenha rotinas claras e uma agenda organizada para os seus dias, na medida do possível – mas não se cobre muito.
  • 3 – Pratique exercícios físicos – diariamente, se possível.
  • 4 – Mantenha-se intelectualmente engajado: leia, estude, consuma informação (com moderação).
  • 5 – Dedique tempo consciente e positivo em família – esforce-se em atividades que compensam a negatividade.
  • 6 – Dedique tempo para ficar sozinho também – se possível, fora de casa, mas dentro de casa também ajuda.
  • 7 – Medite e faça exercícios de relaxamento.
  • 8 – Tome banho de banheira diariamente, se possível (considerando a nossa realidade, eu aqui te recomendaria fazer um bom e velho escalda-pés)
  • 9 – Lembre-se das coisas que você mais gosta de fazer – veja quais você consegue fazer nesse tempo, e encontre formas de fazê-las.
  • 10 – Limite sua exposição a noticiário na TV e internet: defina janelas curtas pra se manter informado, sem exageros.

Cuidando de você mesmo e dando o exemplo, você estará fazendo mais pelo mundo do que imagina. Fique também à vontade de enviar para nós algo mais que tenha ajudado você a manter a sanidade nesses momentos.

Startup visa promover impacto social na saúde por meio de terapia online

A discussão em torno da saúde mental tem sido crescente nos últimos anos. No entanto, ao mesmo tempo em que as pessoas estão falando mais sobre o assunto, os problemas de estresse, depressão e ansiedade parecem ser cada vez mais comuns. Dados recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS), por exemplo, apontam o Brasil como o país mais ansioso do mundo. E, recentemente, a mesma OMS reconheceu a síndrome de burnout como doença.

Veja também:
Podcast: Ansiedade
Síndrome de burnout é reconhecida como doença pela OMS

No meio deste cenário, outra questão se destaca como o principal obstáculo para a boa saúde mental: o custo da terapia. Isso porque, além dos estigmas atrelados ao tratamento psicológico, muitas pessoas não conseguem dispor do investimento necessário para custear um bom terapeuta.

Diante disso, os empresários Tatiana Pimenta e Everton Höpner criaram, em 2016, a plataforma Vittude. Segundo artigo da empreendedora Maure Pessanha para o Estadão, o “negócio de impacto social tem auxiliado os brasileiros a inserir a saúde mental entre as prioridades pessoais”. Até o mês passado, o banco de dados da empresa — que está presente em mais de 50 países — contava com mais de 13 mil usuários e 3 mil psicólogos cadastrados, realizando atendimentos presenciais e online.

“Levando em consideração que metade dos municípios do Brasil não tem psicólogos em suas cidades, a solução tem atuado para democratizar o acesso à terapia, levando a possibilidade de brasileiros e brasileiras serem atendidos por profissionais da plataforma”, ponderou Pessanha. O consultório virtual da Vittude é protegido por criptografia e segue os protocolos internacionais de privacidade.

Corporações

Com o mercado corporativo em mente, os empreendedores lançaram, também, a Vittude Corporate, que ajuda empresas e funcionários com apoio especializado para abordar o tema. “A proposta da Vittude Corporate – cujo objetivo é democratizar o acesso à terapia no ambiente corporativo – é permitir que as empresas protejam o capital intelectual com uma lógica de investir em promoção à saúde mental”, argumentou a empreendedora.

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Algoritmo do Facebook que monitora suicídios evidencia divergências entre empresas de tecnologia e especialistas em saúde

Ao longo de sua história, o Facebook teve que encarar o problema do suicídio de frente algumas vezes. A questão se tornou pessoal quando uma série de pessoas usou a ferramenta de streaming Facebook Live para transmitir, em tempo real, o momento em que tiraram suas próprias vidas. Diante disso, desde 2017, a empresa vem utilizando um “algoritmo de monitoramento de suicídios”, que já esteve envolvido no envio de mais de 3500 equipes de emergência a endereços de pessoas que fizeram postagens sensíveis sobre o assunto.

A ferramenta utiliza tecnologia de reconhecimento de padrões para identificar conteúdo que aparenta expressar intenções suicidas, além de escanear comentários do tipo “você está bem?”. Tais postagens são, então, enviadas a um moderador de conteúdo e, posteriormente, a um profissional treinado que é encarregado de notificar as equipes de emergência.

No entanto, para o psiquiatra e consultor de tecnologia de Harvard, John Torous, o algoritmo pode causar mais dor do que alívio. “Nós, como público, estamos participando desse grande experimento, mas não sabemos se é útil ou não. […] É uma coisa para um acadêmico ou uma empresa dizer que isso vai ou não funcionar. Mas você não está vendo nenhuma evidência de trabalho de campo ou revisão crítica de outros cientistas. […] É preocupante”, disse ao Business Insider.

Sigilo

Torous se refere ao fato de que o Facebook nunca publicou nenhum dado referente a como a ferramenta funciona. Para a empresa, o algoritmo não é um produto de saúde ou uma iniciativa de pesquisa, mas algo semelhante a pedir ajuda ao ver alguém com problemas em um espaço público. “Estamos no negócio de conectar pessoas com comunidades de apoio. Não somos provedores de saúde mental”, afirmou Antigone Davis, que é chefe global de segurança do Facebook, ao BI.

Mas, para o pesquisador, sem informações públicas a respeito da ferramenta, há informações importantes que são impossíveis de serem respondidas: o algoritmo pode focar nos usuários errados, desencorajar discussões francas sobre saúde mental na plataforma ou, até mesmo, escalar e criar uma crise onde não existe uma. “Sabemos que o Facebook construiu [a ferramenta] e está usando, mas não sabemos se ela é precisa, se está sinalizando as pessoas certas ou erradas, ou se está sinalizando as coisas cedo demais ou muito tarde”, concluiu.

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Problemas de saúde mental impedem que “truques de produtividade” funcionem

Quem nunca pesquisou “como ser mais produtivo” no Google, se deparou com uma série de artigos e vídeos que listam os mais variados productivity hacks (ou “truques de produtividade”) e tentou colocar algumas daquelas dicas em prática? Muitas delas funcionam, mas quando problemas psicológicos estão envolvidos, a conversa muda bastante.

Segundo matéria da publicação Elemental, do Medium, a névoa da depressão prejudica os níveis de energia do corpo e o pensamento criativo, enquanto a ansiedade e o estresse pós-traumático podem atrapalhar a concentração. Logo, os hacks populares de produtividade podem não funcionar para essas pessoas. “Todos nós temos um copo emocional. […] Quando seu cérebro se torna quimicamente desequilibrado, seu copo fica sobrecarregado muito mais rapidamente e isso dificulta para você completar as tarefas diárias com eficácia”, explicou a psicoterapeuta Robyn Gold.

No entanto, isso não significa que pessoas com depressão ou ansiedade não consigam ser produtivas no trabalho. Especialmente, se elas entendem como a saúde mental influencia em suas rotinas e conseguem reavaliar as principais dicas de produtividade de acordo com as suas realidades.

Pensar pequeno e tirar intervalos

Para a professora de Psiquiatria e Ciências Comportamentais da Universidade de Washington, Patricia Arean, uma boa maneira de ser produtivo frente a problemas de saúde mental é pensar pequeno: se o projeto parece intimidante, tente encará-lo por partes. “Nossos cérebros estão preparados para procurar coisas no ambiente que são perigosas ou podem nos causar danos. […] Não há nada errado em se sentir um pouco deprimido se você não puder fazer algo que está tentando da primeira vez, mas quando você tem uma doença mental, é mais difícil passar dessa fase”, ponderou.

Outro ponto abordado na reportagem é a importância de tirar intervalos ao longo do dia. Segundo a repórter, quando você está passando por um momento depressivo ou de alta ansiedade, a tentação natural é se esforçar mais. Mas, isso pode ser prejudicial à produtividade. O ideal é, em vez de avançar, fazer uma caminhada por alguns minutos ou ligar para um amigo. Essas atitudes farão com que você volte ao trabalho com outra mentalidade.

Tomar nota e focar no que pode ser feito

Pessoas com estresse pós-traumático, depressão ou ansiedade costumam ter dificuldades com a memória. “Quando seu cérebro está sobrecarregado com pensamentos autodestrutivos ou ansiosos, pode ser difícil prestar atenção no que está acontecendo, o que pode fazer parecer que você não consegue se lembrar das coisas”, escreveu a repórter Jenny J. Chen.  Para isso, uma solução interessante é tomar notas de deadlines, reuniões e assuntos importantes.

Por fim, ao lidar com problemas de saúde mental na vida profissional, é importante focar no que é possível fazer. “Se a sua capacidade de concentração flutuar de maneira previsível, considere a possibilidade de negociar prazos com base no que você acha que pode alcançar realisticamente. Se dê alguma folga nos prazos que são flexíveis, mantendo sua saúde mental em mente quando agendar as suas entregas”, continuou. A longo prazo, a repórter reitera que a melhor maneira de aumentar a produtividade no trabalho quando se lida com problemas de saúde mental é procurando ajuda profissional.

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