Como ser o herói do seu cliente — A primeira proclamação

Como ser o herói do seu cliente — A primeira proclamação

Ao contrário do que o senso comum sugere, você pode — e deve — atuar como especialista, mesmo que esteja começando agora.
  Por Chris Peregom
Foto: Composição / Green Paper Clip Lot / Pexels

Se o seu sonho é lidar com os clientes como o Sherlock Holmes, que senta seus prospectos na cadeira da sala e escuta o briefing só pra decidir se tem interesse ou não no job, essa série é pra você. Eu, particularmente, adoraria ser o Sherlock. Imagina só, ficar todo despreocupado enquanto resolve que prefere investir seu tempo em outra tarefa ao invés de aceitar o cliente e/ou briefing chato e desinteressante.

Em 2010, Blair Enns escreveu um livro pequeno e magnífico, nomeado “A Win Without Pitching Manifesto”, que poderia ser aportuguesado como “Ganhe sem competir: um manifesto”. O livro é fruto de suas várias décadas de experiência trabalhando na indústria criativa, tanto nas trincheiras, quanto como consultor empresarial de agências e estúdios criativos. Seu serviço de consultoria, assim como seu site, foram iniciados 8 anos antes do livro, datando de 2002.

O livro consiste em 12 proclamações, regras ou mantras, para tirar o freelancer criativo, como você, da posição de operário e recebedor de ordens — também conhecido como “mãos do cliente” na roda da malandragem — além de vítima da vontade e orçamento que lhe oferecem, de uma vez por todas. Após reler o livro pela terceira vez, e considerando que não existe ainda uma versão traduzida, resolvi produzir um artigo para cada uma das 12 proclamações, que são, também, 12 temas diferentes, constituindo assim uma série.

Por fim, esses artigos não substituem a leitura do livro; pelo contrário, espero que eles te inspirem a ler. Os artigos também não são resumos ou traduções do livro. São conteúdos originais meramente inspirados pela temática de cada capítulo, e tenho certeza de que, na impossibilidade de ler a fonte, você estará muito bem servido pelas linhas que seguem.

PROCLAMAÇÃO #1 — Nós vamos nos especializar

Cedo ou tarde, todos vamos nos deparar com a difícil decisão de escolher o nicho que queremos atender. Esse é o fundamento de uma carreira gloriosa, reconhecida e bem remunerada. Nichar, ao contrário do que alguns pensam, não é escolher estudar um único tópico dentro da profissão, sendo ignorante no resto. É abrir mão de exercer profissionalmente toda a gama de conhecimentos e habilidades que se tem a fim de potencializar e aprofundar uma única área, visando atender um tipo restrito e específico de cliente — ou persona, na linguagem do marketing.
Em uma frase, nichar é dizer não para todos os clientes que pedem pra você fazer ou contribuir com um projeto que não tem a ver com a especialidade que você escolheu; mesmo que você saiba e já tenha feito esse tipo de projeto no passado.

Existem vários parâmetros que ajudam a escolher um bom nicho dentro da sua área, mas não adianta falar disso agora, já que você ainda não vê a lógica de ser melhor remunerado e ter melhores clientes ao passar a dizer não para vários prospectos, né? A gente volta nisso depois. Vamos começar pelo começo.

Eu adoro comparar o trabalho criativo com as profissões mais tradicionais, só para analisar como a lógica operacional não se sustenta. Uma das instâncias em que a comparação não rola é exatamente na hora de nichar. Veja bem: você pretende gastar R$5.000 em um pc novo, que dê conta do seu trabalho pelos próximos 4 anos. Você opta por comprá-lo em uma loja de eletrodomésticos, ao lado de máquinas de lavar e sofás, ou confiaria em uma empresa especializada em workstations, que só trabalha montando computadores para profissionais que trabalham em home office? Mesmo que o preço seja maior, a expertise transmitida pela empresa especializada ativa todos os seus gatilhos de confiança e empatia, ainda que inconscientemente, e, creio eu, você optaria por ela.

Vamos continuar.

Desconsiderando as regras da OMB para fins ilustrativos, imagine que você precisa fazer uma séria cirurgia no coração e tem duas opções para te operar: um cardiologista e um clínico geral, ambos médicos muito respeitados e experientes. Eu não sei você, mas eu fico com a primeira opção. Talvez o clínico geral, por inclinação e interesse próprios, tenha ótimos conhecimentos de cardiologia. Por outro lado, o cardiologista também foi um clínico geral um dia. Ele sabe um pouco de pulmão, de osso, de pele, de fígado, de intestino, de músculo e de estômago, mas optou por não atender nenhuma dessas especialidades para ser um ótimo tratador de corações. Você diria que o cardiologista é pior remunerado que o clínico geral porque sua gama de pacientes é bem menor?

Ainda dentro da medicina, não é novidade que os cirurgiões estão no nicho mais bem pago da profissão. De todas as consultas que você já fez, certamente já foi muito mais em dermatologistas, oftalmologistas e ginecologistas do que em cirurgiões. A impressão é de que estes que passam o dia atendendo estão nadando no dinheiro (uma impressão bastante real). A verdade, porém, é que uma única cirurgia pode equivaler a uma semana, ou mais, de atendimentos destas outras categorias. Como se não bastasse, quem opta por nichar não apenas em cirurgia, mas cirurgia plástica, que já elimina uma parcela imensa de possíveis pacientes, ganha mais que todo o resto.

Ainda vejo você insatisfeito com estes argumentos. Deixa eu insistir em mais um. Se estiver satisfeito, pode pular este parágrafo! Seu iPhone pifou de vez. Pode ser bateria, tela, chip, ninguém sabe. Sua tia tem uma oficina onde são consertados notebooks, tvs, celulares, eletrodomésticos em geral e fazem formatação de PC por R$75. Do outro lado da sua rua tem uma assistência técnica autorizada da Apple que conserta Apple e somente Apple. E nem consertam do iPhone 4 para baixo. Você sabe, muito velho… Você olha pro seu iPhone inoperante, olha pra sua tia, olha pra assistência da Apple, olha pra sua tia, olha pro iPhone, olha pra assistência. Enfim. Se você levar na sua tia é por pura consideração.

Por que, então, permanecemos com a fantasia de que quanto mais “sim” dissermos por aí, mais dinheiro vai entrar e mais seremos reconhecidos? Por, basicamente, dois motivos. Primeiro, somos fruto de uma cultura que enxerga o “não” como negativo. Irônico pensar assim. O poder do “não” é o que nos faz aprender, crescer, e selecionar. Diga “não” com mais frequência e seja mais feliz. O segundo motivo é a dúvida existencial. Não sabemos definir aquilo que fazemos! Quer saber se é o seu caso? Tente preencher essa fórmula simples abaixo:

Eu ajudo _____________ (público, organização ou tribo)
a ________________ (o que você faz para ajudá-los?)
através de ___________________ (como você os ajuda?)
que __________________ (por que? Que diferença você faz na vida deles?)

Um exemplo preenchido seria:
Eu ajudo startups
a explicarem seus projetos
através da criação de infográficos
que são facilmente entendidos pelos investidores.

Este não é um post sobre branding, mas o princípio básico da especialização é entender claramente o que você faz, para quem e por que. Enquanto você for simplesmente um “designer gráfico”, “web designer”, “escritora” ou “social media”, você está competindo com um mar de gente, e nessa competição, vai ganhar quem se oferece pelo menor valor. Quando você não escolhe se especializar, você está, passivamente, escolhendo se tornar uma commodity, como um saco de arroz, que fica ao lado de outras cinco marcas no supermercado, e seu único parâmetro de comparação é o preço, já que tudo parece a mesma coisa por dentro.

Esse é o propósito final de escolher um nicho: se tornar diferente e mais valioso que todos os seus concorrentes aos olhos do seu cliente ideal. Sabe aquela relação não saudável em que o cliente acha que manda em você? “Tem que aumentar o logo”, “tem que traduzir dessa forma”, “tem que criar um menu maior no cabeçalho”. Ela só existe porque o cliente não te vê como expert. Ele sabe que pode conseguir outra pessoa pra fazer o mesmo trabalho no momento em que se cansar de você. Continuando, sabe aquele momento chato em que você não consegue emplacar o valor que você gostaria de receber? Você pede R$5000 e o cliente diz que só paga R$1200. Acontece pelo mesmo motivo. Ele te enxerga como qualquer outro, e ele tem noção de quanto os outros cobram pelo mesmo serviço.

É simples de entender. Voltando à história do arroz, imagina que você queira comprar 5kg de arroz no supermercado e vê que certa marca está custando R$120. Ao lado, todas as outras opções: R$14,20; R$12,90; R$16,55. Você pegaria o de R$120? Claro que não. Agora, se você vai numa loja de suplementos para academia e vê um arroz diferente, escrito “Arroz proteico de rápida absorção enriquecido com Whey Protein”, numa embalagem totalmente direcionada a fisiculturistas e — pasme, o arroz tem uma coloração diferente: é laranja — você não acha que haveria público para levá-lo pra casa? A marca não precisou fazer quase nada de diferente, senão escolher um público e direcionar sua propaganda—que é a alma do negócio—para ele. Eles não querem vender pra todo mundo. Querem vender para fisiculturistas. Como não existe outro arroz que ofereça o que esse de R$120 diz oferecer, ele está livre para definir o seu valor. Por isso nichar é tão importante.

Escolher um bom nicho vai depender exclusivamente de você. Suas habilidades, personalidades, sonhos, preferências, facilidades e clientes atuais. Parâmetros comuns para embasar a escolha são:

  • especializar-se na área mais bem remunerada da sua profissão, como o médico-cirurgião plástico;
  • especializar-se na área que você tem maior facilidade de lidar, produzir e crescer;
  • especializar-se no tipo de trabalho que você adora fazer enquanto generalista;
  • especializar-se na área que você deseja atingir quando olha para suas referências e inspirações de profissão;
  • especializar-se no trabalho que falta dentro da sua cidade ou profissão. Nesta opção, é possível que você encontre o famoso oceano azul e lidere o mercado;
  • especializar-se na área em que as pessoas já te consideram expert.

Seja como for, não ignore essa grande decisão. Se você não escolher nichar, já está fazendo uma escolha. Não existe essa de “eu atendo todo mundo”, ou “meu cliente é qualquer um”. Algumas considerações finais são:

Você pode nichar a partir do primeiro dia de freelancer. Não precisa se forçar a um período como generalista se você já tiver desejo por alguma especialidade.

Você pode nichar numa área que ainda não domina. Muita gente faz isso. Só precisa posicionar sua marca para atingir os clientes certos e correr atrás do conhecimento. Nicho não é eterno. Você pode se posicionar para um público agora e mudar a direção do leme se o vento soprar melhor pro outro lado a qualquer momento. Só não pode querer pegar todos os ventos ao mesmo tempo. Nichar em prestação de serviço parece mais complicado do que em venda de produto. É só impressão. A questão é que quando o produto somos nós, queremos nos apresentar o mais completo possível. Isso inclui aceitar todo tipo de proposta que sabemos dar conta. Não faça isso, você está sabotando seu próprio negócio.

Como sempre, eu gostaria de ouvir sua voz sobre isso! Compartilhe nos comentários em que estágio você está dessa especialização. Já deu o pulo do gato? Pretende fazê-lo em breve? Fique ligado, também, nas próximas postagens da série.

 

Todas as informações contidas neste artigo são de responsabilidade do seu autor e não, necessariamente, refletem a opinião do site.

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 Publicado em 11/02/2019 Atualizado em 18/02/2019
Chris Peregom Motion designer. Ama livros velhos de capa dura, deseja entender cada vez mais a mente e seus vieses, vive aprendendo a aprender, escreve as tarefas do dia em post-its, graduado em música.
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